domingo, 27 de março de 2011

Portugueses limitam crescimento de cancro manipulando ambiente celular

Cientistas portugueses conseguiram travar o crescimento do cancro manipulando o ambiente que envolve as células cancerosas. O estudo publicado na revista Oncogene mostra pela primeira vez por que é que vários tipos de cancro bloqueiam a actividade do gene LRP1B. A descoberta pode abrir portas para novas terapias.

O LRP1B não desaparece das células cancerosas, mas é como se o fizesse. Em 2010, uma equipa de Cambridge descobriu que o gene estava entre os dez genes mais bloqueados em 3312 cancros. “Verificámos que nos tumores da tiróide havia uma repressão significativa deste gene”, disse Hugo Prazeres ao PÚBLICO, primeiro autor do artigo, que trabalha no Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto. O estudo foi liderado por Paula Soares.

A proteína é especialmente activa nas células da tiróide e do tecido nervoso, mas também aparece silenciada no cancro colo-rectal, do pulmão, da bexiga e noutros. Os cientistas descobriram que este bloqueio acontece de três formas. O gene pode ser mutado e não originar uma proteína normal, podem ligar-se pequenas moléculas que emaranham o ADN e impedem a maquinaria celular de iniciar a produção da proteína e o processo pode ainda ficar bloqueado depois de a maquinaria ter produzido o ARN – a molécula que codifica os aminoácidos que juntos formam a proteína.

“Investigámos o que é que acontecia se introduzíssemos o gene funcional LRP1B em tumores, uma das coisas mais importantes foi a repressão da invasão”, disse o cientista. A equipa conseguiu travar o crescimento tanto em células in vitro como em modelos animais. O passo seguinte foi compreender qual a função desta proteína membranar.

“A molécula faz parte da família de receptores de lipoproteínas que conhecemos melhor por internalizarem o colesterol para dentro das células”, explicou o investigador. Ou seja esta proteína membranar “retira moléculas solúveis do ambiente extracelular para o interior da célula”.

As substâncias solúveis ligam-se a várias proteínas LRP1B. Depois, o pedaço de membrana celular que tem as proteínas, com ajuda da maquinaria celular, é puxado para dentro da célula, transformando-se numa vesícula redonda.

A equipa do IPATIMUP descobriu que, neste caso, a substância retirada pela proteína membranar do espaço extracelular é a MMP2, uma enzima conhecida por degradar a matriz que une as células. Na mulher o gene da MMP2 é expresso em altos níveis no útero e é activado pela menstruação. “A degradação do endométrio é mediada por esta enzima”, disse Prazeres, exemplificando uma das utilidades desta proteína.

Quando as células cancerosas inibem a produção da proteína membranar LRP1B, que normalmente recolhe a enzima MMP2 do ambiente fora da célula, a enzima continua lá, a degradar a matriz extracelular, “o que permite arranjar espaço para as células tumorais crescerem”. O que faz com que o tumor possa evoluir.

A equipa está a investigar outras substâncias do meio extracelular que como o MMP2 podem ajudar à propragação dos tumores. Terapias que controlem o cancro manipulando este meio não têm a desvantagem de ser ultrapassadas se as células cancerosas ganharem resistência, como acontece nas terapias tradicionais. “O LRP1B surge neste estudo como uma possível ferramenta terapêutica”, disse Prazeres.

http://www.publico.pt/Ciências/portugueses-limitam-crescimento-de-cancro-manipulando-ambiente-celular_1486673

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