segunda-feira, 9 de junho de 2014

Associação Portuguesa dos Nutricionistas distingue estudos sobre doença celíaca

Dois trabalhos sobre a doença celíaca deram distinções a três investigadoras da Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica – Porto. Atribuídos no âmbito do 11º Congresso anual da Associação Portuguesa dos Nutricionistas (APN), os prémios distinguiram trabalhos no âmbito do projecto«Ser celíaco em Portugal».

O trabalho «Grau de adesão à dieta isenta de glúten, disponibilidade de produtos alimentares específicos e grau de satisfação numa amostra de celíacos em Portugal» recebeu o segundo prémio para melhor comunicação oral e o projecto «Frequência de visita a profissionais de saúde e grau de satisfação relativo às diferentes fontes de informação acerca de doença celíaca e dieta isenta de glúten» ganhou o segundo prémio para melhor poster científico.

Contactada pelo «Ciência Hoje», Ana Sofia Pimenta explica que “a doença celíaca é um distúrbio de carácter autoimune precipitado pela ingestão de cereais que contém glúten, em indivíduos geneticamente predispostos”. Tradicionalmente, “era considerada uma síndrome de má absorção rara na infância”, refere. Hoje em dia sabe-se que “é uma condição mais frequente, que pode ser diagnosticada em qualquer idade e que afecta múltiplos sistemas de órgãos”.
Até à década de 70, conta a investigadora, “estimava-se que a prevalência global de doença celíaca na população correspondia a 0,03 por cento e que afectava maioritariamente os indivíduos de origem europeia”.
No entanto, “a introdução de técnicas endoscópicas gastrointestinais nos anos 70, a identificação de duas moléculas HLA (antigénio leucocitário humano)-DQ2, nos anos 80, e o HLA-DQ8, no inicio da década de 90”, bem como o “reconhecimento do amplo espectro clínico da doença e o desenvolvimento de testes serológicos altamente específicos revelaram que a doença é mais prevalente do que se pensava”.
Prevalência e diagnóstico
A prevalência da doença celíaca "é maior nos grupos de risco, nomeadamente familiares de doentes celíacos, portadores de síndrome de Down e indivíduos com outras doenças autoimunes, como por exemplo diabetes mellitus tipo 1", explica a investigadora Ana Sofia Pimenta. A doença pode diagnosticar-se em qualquer idade, porém, "parece surgir mais frequentemente na infância ou na quarta ou quinta década de vida". Os estudos mais recentes têm vindo a sugerir "o aumento da incidência em pessoas mais velhas, sendo que, actualmente, se debate se o diagnóstico de doença celíaca em idade avançada corresponde, de facto, ao real desenvolvimento da doença em idade tardia ou se se prende com atrasos no diagnóstico". Apesar dos avanços nos métodos de rastreio e diagnóstico, a doença permanece subdiagnosticada. Pensa-se que "por cada caso diagnosticado, existam entre 5 a 10 casos por diagnosticar, dado o predomínio de manifestações clínicas atípicas ou até mesmo ausência de sintomas". Muitos portadores de doença  desconhecem, assim, a sua condição. São igualmente frequentes"atrasos entre o início da sintomatologia e o diagnóstico de doença celíaca, muitas vezes por diagnósticos anteriores incorrectos".
Estima-se que “a prevalência na população em geral na Europa e nos Estados Unidos da América seja de, aproximadamente, 1 por cento. Em Portugal, os estudos são escassos. No entanto, estima-se que a prevalência ronde 0,7 por cento, de acordo com os resultados de um estudo efectuado numa população de adolescentes”.
«Ser celíaco em Portugal»
Os dois trabalhos premiados no congresso “resultam do projecto mais amplo «Ser celíaco em Portugal: caracterização de uma amostra de celíacos», que contou, desde o início, com o aval da Associação Portuguesa de Celíacos” (APC).
Participaram no estudo 201 indivíduos portadores da doença com idade igual ou superior a 16 anos, residentes na maioria dos distritos de Portugal, incluindo as Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
Com um dos trabalhos pretendíamos descrever a frequência de visita dos doentes celíacos a diferentes profissionais de saúde e aferir o grau de satisfação quanto às informações transmitidas pelas diversas fontes. Verificámos que 56 por cento dos participantes consultava o gastrenterologista e 44 por cento o clínico geral, pelo menos, uma vez por ano, atendendo à condição de celíaco”.
Resultados
A maioria dos inquiridos referiu não visitar o nutricionista (70,6 por cento) ou o dietista (83,5 por cento). Quanto ao grau de satisfação com as diferentes fontes de informação, 30 por cento dos participantes que assinalaram o gastrenterologista mostraram-se muito satisfeitos com as informações prestadas. A percentagem de participantes insatisfeitos com as informações do clínico geral foi superior à dos satisfeitos.
Relativamente às informações fornecidas por nutricionistas e dietistas, a maioria que as considerou mostrou-se satisfeita. Grande parte dos participantes mostraram-se satisfeitos com as informações transmitidas pela Internet e a esmagadora maioria mostrou-se satisfeito com as informações fornecidas pela APC.
Quanto às informações dadas pelos meios de comunicação social (televisão e rádio), 45 por cento mostrou-se insatisfeito. A maioria dos celíacos considera que a população em geral não está suficientemente esclarecida quanto à doença. Maior divulgação através da comunicação social e formação dos profissionais de saúde foram as principais sugestões apontadas para aumentar o conhecimento da população.
Estes resultados reflectem a necessidade dos profissionais de saúde investirem na sua formação acerca da doença celíaca e do seu tratamento, prestando informações actualizadas e consistentes e cuidados que vão ao encontro das expectativas dos doentes”, considera.
Dieta sem glúten
O trigo é um dos vários cereais que contêm glúten
O trigo é um dos vários cereais que contêm glúten
 Com o trabalho «Adesão à dieta isenta de glúten, disponibilidade de produtos alimentares específicos e grau de satisfação numa amostra de celíacos em Portugal», verificou-se que 97 por cento dos inquiridos tenta cumprir a dieta isenta de glúten na sua alimentação diária, sendo que apenas metade da amostra nunca consumia alimentos com glúten.
Porém, 10 por cento consumia-os diariamente. A falta de alternativa, a escolha própria e o preço constituíram as principais razões para quebrar a dieta. Após o consumo de glúten metade dos participantes experimentavam dor e distensão abdominal, 47 por cento diarreia e 18 por cento alterações de humor.
Uma minoria dos participantes considerou fácil encontrar alimentos específicos sem glúten à venda e a maioria mostrou-se insatisfeita no que concerne ao preço, à variedade e à disponibilidade dos referidos produtos no mercado. Quando questionados acerca de que alimentos aptos para celíacos gostariam de encontrar disponíveis, um quarto dos participantes referiram maior variedade de produtos de padaria e pastelaria.
Um maior conhecimento das dificuldades e expectativas dos celíacos relativamente ao cumprimento da dieta isenta de glúten pode constituir um estímulo para a maior produção, reformulação e oferta de alimentos por parte da Indústria Alimentar. A disponibilidade e a variedade de alimentos destinados a doentes celíacos sensorialmente atractivos e a preços competitivos são factores que podem contribuir para a adesão à dieta isenta de glúten”, conclui.
Os celíacos devem seguir uma dieta isenta de glúten. Os cereais trigo, cevada, centeio e aveia devem ser evitados bem como os seus derivados (alimentos feitos com as respectivas farinhas). Os cereais sem glúten são o arroz, o milho e o sorgo.

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