quarta-feira, 1 de junho de 2011

E.coli: «Fora do intestino, dá muitas 'chatices'»

Há uma semana, a Escherichia coli (E.coli) era completamente desconhecida para a grande maioria das pessoas, mas hoje está nas bocas do mundo graças às 16 mortes que uma das suas estirpes já provocou num curto espaço de tempo.

A estirpe que afectou as vítimas - e que hoje soubesse-se não corresponder à dos pepinos espanhóis a que tinha sido atribuída a origem do problema - é designada por serotipo EHEC 0104 e causa uma doença grave cujos sintomas principais são diarreia com sangue e insuficiência renal.

Apesar de os efeitos nefastos desta estirpe, a E.coli é “uma bactéria normal do intestino”, que toda a gente tem, pois é importante para a saúde. No entanto, “pode ganhar outras funções pela transferência horizontal de genes, tornando-se transportadoras de toxina. É uma bactéria intestinal que, fora do intestino, dá muitas ‘chatices’, como a insuficiência renal”, explicou ao «Ciência Hoje» José Moniz Pereira, coordenador do Centro de Patogénese Molecular-Unidade dos Retrovírus e Infecções Associadas da Universidade de Lisboa (UL).
Segundo o investigador, “algumas estirpes ganham genes que produzem toxinas e é assim que aparecem as diversas variantes de E.coli, que provocam vários tipos de patologias. Há algumas patogénicas, outras não, umas mais virulentas do que outras”.

Relativamente à E.coli enterohemorrágicas (EHEC), que tem provocado o surto de infecções alimentares na Alemanha, trata-se de uma estirpe com capacidade de produzir verocitotoxina, uma toxina que provoca no ser humano gastroenterites agudas, com cólicas abdominais, diarreia com sangue, febre moderada e vómitos, sintomas que podem evoluir, por força da queda do número de plaquetas, para uma síndrome hemorrágica, em alguns casos mortal.

Nesta fase mais grave, conhecida por síndrome hemolítica-urémica (SHU), a infecção já está espalhada pelo organismo. De acordo com José Moniz Pereira, neste estado, os vasos sanguíneos são afectados pela E.coli, na medida em que já entrou na circulação, “perturbando, sobretudo as funções renais”, com danos por vezes irreversíveis.



Origem do "surto" foi inicialmente atribuída a pepinos espanhóis
Esta estirpe patogénica da bactéria é de origem animal. O investigador da UL acredita que pode ser transferida para vegetais “que possam ter estado em contacto com dejectos animais”, através das águas de rega ou durante o transporte, venda ou preparação. Daí a “necessidade de os vegetais serem muito bem lavados”, sobretudo quando são ingeridos crus.

Uma vez que as bactérias sucumbem a temperaturas superiores aos 70 graus centígrados ou inferiores aos 20 negativos, as hortaliças que são cozidas durante dez minutos não apresentam este perigo de infecção, sendo que, à partida, os ultra-congelados também não.

Relativamente à utilização de antibióticos, estas bactérias podem ser resistentes a muitos deles, graças a “um plasmídeo de resistência, elemento genético extracromossómico que faz com que a bactéria ganhe mais funções”, revelou José Moniz Pereira.

Já Miguel Vicente Muñoz, investigador do Centro Nacional de Biotecnologia espanhol, disse ao jornal «El País» que “eliminar qualquer E.coli é difícil pois estão protegidas por uma capa de três camadas (outras como as da pneumonia só têm duas). Além disso, as estirpes malévolas têm genes de resistência a vários antibióticos e possuem, inclusivamente, mecanismos para aumentar a produção da toxina quando se pretende eliminá-las. O antibiótico, em vez de curar, pode agravar o problema”.

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